Senador vai ao STF pedir impeachment de ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles

Por que o Senador não propõe o processo de crime de responsabilidade no próprio Senado Federal? O JT News faz breve análise do fato à luz da lei, da Constituição Federal e da jurisprudência do STF

Conforme noticiou hoje (22), a Coluna Painel da Folha de S. Paulo, o senador Fabiano Contarato (Rede-ES), presidente da Comissão de Meio Ambiente, decidiu pedir ao Supremo Tribunal Federal o afastamento do ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente), usando como argumento o regramento do impeachment.

Foto: Adriana Machada/ReutersRicardo Sales ministro do Meio Ambiente
Ricardo Sales ministro do Meio Ambiente

O parlamentar afirma que o ministro cometeu crime de responsabilidade nas suas decisões no cargo e cometeu atos incompatíveis com a função “ao perseguir agentes públicos”.

Em abril, o presidente do ICMBio  (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), Adalberto Eberhard, pediu demissão após o ministro ameaçar investigar agentes públicos diante de uma plateia de ruralistas.

Foto: Agência SenadoSenador Fabiano Contarato
Senador Fabiano Contarato

Contarato argumenta ainda que Salles infringiu a Constituição ao alterar a governança do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), conselho que reúne representantes do governo e de ONGs para discutir as políticas ambientais no país, e que não puniu responsáveis por autorizar a exploração na área de proteção de Abrolhos, no sul da Bahia.

O JT News faz breve análise do fato à luz da lei, da Constituição Federal e da jurisprudência do STF

A Lei Federal Nº 1.079, de 10 de abril de 1950 disciplinas as condições em que autoridades podem cometer crime de responsabilidade. Esta lei define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento. Portanto, o ministro Ricardo Sales, se cometeu crime de responsabilidade deve ser julgado noas termos dessa lei ora referenciada.

Já a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, assegura em seu art. 52, Inciso I, a competência priivativa Senado Federal:

 I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles; [,,,].

Poder-se-ia perguntar: Por que o Senador não propõe o processo de crime de responsabilidade no próprio Senado Federal?

Não é tão simples como parece ser, pois o ministro de Estado só pode ser processado pelo Senado em Crime de Responsabilidade, se este (crime) for conexo com o do Presidente, ou seja, tiver relação direta com o do Presidente ou Vice-Presidente da República, como bem diz o texto constituciional ora referenciado.

Foto: Jacinto Teles / JTNewsSTF
STF

Então, ministros de Estado, conforme jurisprudência do STF, somente será necessária a autorização se o crime, comum ou de responsabilidade, tiver conexão com os cometidos pelo Presidente ou Vice-Presidente da República.

O Presidente da República, por crime comum, será julgado perante o STF (CF, art. 102, I, "a"). No caso de crime de responsabilidade, o julgamento ocorrerá perante o Senado Federal (CF, art. 52, I).

O STF na análise de controle concentrado de constitucionalidade assim decidiu acerca do assunto:

"O processo de impeachment dos ministros de Estado, por crimes de responsabilidade autônomos, não conexos com infrações da mesma natureza do presidente da República, ostenta caráter jurisdicional, devendo ser instruído e julgado pelo STF. Inaplicabilidade do disposto nos arts. 51, I, e 52, I, da Carta de 1988 e 14 da Lei 1.079/1950, dado que é prescindível autorização política da Câmara dos Deputados para a sua instauração. [Pet 1.656, rel. min. Maurício Corrêa, j. 11-9-2002, P, DJ de 1º-8-2003.]"

"Ao Senado compete, privativamente, processar e julgar o presidente (art. 52, I), locução que abrange a realização de um juízo inicial de instauração ou não do processo, isto é, de recebimento ou não da denúncia autorizada pela Câmara. (...) Por outro lado, há de se estender o rito relativamente abreviado da Lei 1.079/1950 para julgamento do impeachment pelo Senado, incorporando-se a ele uma etapa inicial de instauração ou não do processo, bem como uma etapa de pronúncia ou não do denunciado, tal como se fez em 1992. Estas são etapas essenciais ao exercício, pleno e pautado pelo devido processo legal, da competência do Senado de processar e julgar o presidente da República. Diante da ausência de regras específicas acerca dessas etapas iniciais do rito no Senado, deve-se seguir a mesma solução jurídica encontrada pelo STF no caso Collor, qual seja, a aplicação das regras da Lei 1.079/1950 relativas a denúncias por crime de responsabilidade contra ministros do STF ou contra o PGR (também processados e julgados exclusivamente pelo Senado). Conclui-se, assim, que a instauração do processo pelo Senado se dá por deliberação da maioria simples de seus membros, a partir de parecer elaborado por comissão especial, sendo improcedentes as pretensões do autor da ADPF de (i) possibilitar à própria Mesa do Senado, por decisão irrecorrível, rejeitar sumariamente a denúncia; e (ii) aplicar o quórum de 2/3, exigível para o julgamento final pela Casa Legislativa, a esta etapa inicial do processamento. [ADPF 378 MC, rel. p/ o ac. min. Roberto Barroso, j. 16-12-2015, P, DJE de 8-3-2016.].

STF decidiu recente que ministros de Estado respondem por Improbidade Administrativa no 1º Grau de Jurisdição

Por outro lado, o ministro Ricardo Salles do Meio Ambiente [se realmente comprovada a ocorrência de prática do ilícito alegado pelo senador Fabiano Contarato], pode ser responsabilizado por Improbidade Administrativa, cujo julgamento deve ocorrer no Juízo do Primeiro Grau de Jurisdição. 

Foto: Nelson Jr/STFRoberto Barroso Relator do Processo
Roberto Barroso Relator do Processo

E, também, quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de responsabilidade, por expressa decisão do STF [julgado recente, especialmente do segundo semestre de 2018], conforme julgado aqui transcrito:

"Os agentes políticos, com exceção do Presidente da República, encontram-se sujeitos a um duplo regime sancionatório, de modo que se submetem tanto à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa, quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de responsabilidade. Não há qualquer impedimento à concorrência de esferas de responsabilização distintas, de modo que carece de fundamento constitucional a tentativa de imunizar os agentes políticos das sanções da ação de improbidade administrativa, a pretexto de que estas seriam absorvidas pelo crime de responsabilidade. A única exceção ao duplo regime sancionatório em matéria de improbidade se refere aos atos praticados pelo Presidente da República, conforme previsão do art. 85, V, da Constituição. O foro especial por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal em relação às infrações penais comuns não é extensível às ações de improbidade administrativa, de natureza civil. Em primeiro lugar, o foro privilegiado é destinado a abarcar apenas as infrações penais. A suposta gravidade das sanções previstas no art. 37, § 4º, da Constituição, não reveste a ação de improbidade administrativa de natureza penal. Em segundo lugar, o foro privilegiado submete-se a regime de direito estrito, já que representa exceção aos princípios estruturantes da igualdade e da república. Não comporta, portanto, ampliação a hipóteses não expressamente previstas no texto constitucional. E isso especialmente porque, na hipótese, não há lacuna constitucional, mas legítima opção do poder constituinte originário em não instituir foro privilegiado para o processo e julgamento de agentes políticos pela prática de atos de improbidade na esfera civil. Por fim, a fixação de competência para julgar a ação de improbidade no 1º grau de jurisdição, além de constituir fórmula mais republicana, é atenta às capacidades institucionais dos diferentes graus de jurisdição para a realização da instrução processual, de modo a promover maior eficiência no combate à corrupção e na proteção à moralidade administrativa. [Pet 3.240 AgR, rel. p/ o ac. min. Roberto Barroso, j. 10-5-2018, P, DJE de 22-8-2018.]".

Fonte: JT News

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