Quem (ou o que) nós, brasileiros, somos? Por Flávio José Pereira

"Se não somos tratados como animais, nem plantas, nem objetos, o que representaria o desdém dispensado a nós, pessoas?"

Quando não temos nossas necessidades atendidas, costumamos dizer que "nos tratam como cachorro". Creio que seja tempo de aposentar essa expressão, já que outras coisas, como corrupção e indignação (talvez nem nós mesmos!), não têm descanso no Brasil. 

Foto: ZÉ PAULO/JTNEWSFlávio José é agente penitenciário e escritor (FOTO PARA DESTAQUE)
Flávio José Pereira é policial penal, professor e escritor

Digo isso porque, em primeiro lugar, proferidas tais palavras, estaríamos expondo certo menosprezo pelos animais. Além do que, há leis que os defendem e indivíduos que os amam. Então, que comparação seria mais adequada? 

Pensei em planta. Entretanto, com exceção do governo Bolsonaro, o mundo inteiro protege a vegetação, e quase todos os humanos gostam da flora. 

Quiçá "objeto" seja o vocábulo que melhor defina o descaso com que políticos nos tratam. Mas também não é apropriado. Eu, por exemplo, cuido muito bem de meus pertences: estou sempre gastando dinheiro para que meu carro receba os melhores cuidados – banho, polimento (uma espécie de massagem), troca de óleo (automóveis também precisam), calibragem de pneus, etc. Também tenho muito zelo com minhas roupas, meus livros, minha cama. Até o chão onde piso recebe tratamento especial – vassoura e pano macios, e água para limpar e refrescar. 

Se não somos tratados como animais, nem plantas, nem objetos, o que representaria o desdém dispensado a nós, pessoas? 

Imaterialidade. Isso mesmo! A princípio, escolhi o substantivo "esquecimento". No entanto observei que sequer isso nós somos: pois não se esquece daquilo que não existe. 

Eu precisava encontrar um troço que não se vê nem se toca, de que não se sente cheiro nem a presença, de que não há lembrança nem lapso. 

Nada! É o que somos para os mandatários da Nação. Não o pronome indefinido, que tem um lugar cativo na Gramática da Língua Portuguesa. É "nada" na acepção real: o que não tem existência. 

Não se engane! De tempos em tempos, surge do nada o eleitor. Não demora, volta a ser nada.

*Flávio José Pereira da Silva é escritor, professor, licenciado em Letras Português e Policial Penal do Piauí.

Fonte: JTNEWS

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