MPF do Pará faz exigência ao Sistema Prisional para retornar visitas a presos, mesmo ante a Pandemia

"Estabeleço o prazo de 72 horas para que Vossa Senhoria se manifeste, de forma fundamentada, acerca do acatamento ou não da presente Recomendação," determinou Nicole Campos, procuradora da República

Doze membros do Ministério Público no Estado do Pará, sendo o primeiro signatário, a procuradora da República, Nicole Campos Costa [ela que é Procuradora Regional dos Direitos do Cidadão no Estado do Pará], expediram Recomendação em "tom de ordem judicial" ao governador do Estado, Helder Barbalho, ao secretário de Administração Penitenciária, Jarbas Vasconcelos e ao coordenador da Força Tarefa de Intervenção Penitenciária no Estado.

Foto: Jacinto Teles/JT NewsSede da PGR, onde Raquel Dodge vai emitir parecer na Ação dos delegados
Ministério Público Federal [PGR] em Brasília a quem o MPF-PA é subordinado

Dentre as observações feitas pelo MPF no Pará, estão:

Os membros do Ministério Público Federal no Estado do Pará, alegam  que o Estado deve assegurar o direito à saúde das pessoas privadas de liberdade, nos termos da Constituição Federal e do art. 14 da Lei de Execução Penal, por outro lado, que as medidas a serem adotadas não podem violar ou impedir a fruição de outros direitos fundamentais, igualmente protegidos pela Constituição Federal, de forma que se deve buscar a harmonização entre os direitos protegidos, visando sempre evitar o afastamento absoluto de um direito em detrimento do outro.

Alega ainda o documento, que as medidas adotadas em meio a uma crise de saúde pública não devem afastar, de forma absoluta, os direitos fundamentais das pessoas detidas, considerando que a convivência familiar faz parte do núcleo mínimo de direitos fundamentais, estando ligada à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da Constituição Federal).

Que a garantia do direito de visita visa a manutenção dos laços familiares e comunitários do interno, exercendo papel relevante no processo de ressocialização. Nesse sentido o documento cita o jurista doutrinador Júlio Fabrinni Mirabete: 

"Fundamental ao regime penitenciário é o princípio de que o preso não deve romper seus contatos com o mundo exterior e que sejam debilitadas as relações que o unem aos familiares e amigos. Não há dúvidas de que os laços mantidos principalmente com a família são essencialmente benéficos para o preso, porque o levam a sentir que, mantendo contatos, embora com limitações, com pessoas que se encontram fora do presídio, não foi excluído da comunidade."

O Ministério Público ao final recomenda que "as visitas de familiares e amigos, bem como de advogados, às pessoas privadas de liberdade nos estabelecimentos penais do Estado do Pará sejam permitidas, de forma regrada e restrita, na medida necessária ao enfrentamento da pandemia causada pelo novo coronavírus, sem, no entanto, que haja o impedimento de forma absoluta". 

Foto: DivulgaçãoGovernador Helder Barbalho e secretário de Administração Penitenciária do PA sendo recebidos no DEPEN pelo diretor de Políticas Penitenciárias, Sandro Abel Barradas
Governador Helder Barbalho e o secretário de Administração Penitenciária do PA sendo recebidos no DEPEN pelo diretor de Políticas Penitenciárias, Sandro Abel Barradas. O DEPEN foi o primeiro órgão a estabelecer suspensão de visitas no Sistema Penitenciário Federal

Alegam ainda os Procuradores da República [12 integrantes da Instituição assinaram o documento] que outras alternativas menos gravosas, tais como: adoção do fracionamento de visitas (meio preferencialmente recomendado pelo Conselho Nacional de Justiça – Recomendação nº 62/2020 – art. 11, V), restrição do número de visitantes por preso, restrição da frequência e da duração das visitas, construção ou reforma do parlatório (com vidro e microfone para impedir o contato físico), entre outros meios.

E conclui o documento dando "ordem" que em 72 horas as autoridades se manifestem de forma fundamentada acerca do acatamento ou não da presente Recomendação, indicando, em caso positivo, cronograma que observe a urgência que o caso requer, para a implementação integral das medidas antes mencionadas, alertando às autoridades que o não cumprimento acarretará medidas judiciais cabíveis no âmbito civil e criminal.

Sindicato dos Policiais Penais do Pará lamenta posição do Ministério Público Federal

Acerca da Recomendação do MPF-PA, o JTNEWS ouviu o presidente do Sindicato dos Policiais Penais do Estado do Pará (SINPOLPEN-PA), Rosivan Santos, o líder sindical da categoria dos Policiais Penais ficou surpreso quando tomou conhecimento da Recomendação emanada do órgão do Ministério Público Federal no Pará, e assim maifestou-se ao JTNEWS:

"Como representante dos profissionais da segurança pública integrantes da Polícia Penal do Pará, nos manifestamos plenamente desfavorável a essa medida do Ministério Público, porque não precisa ser profissional de saúde para entender que neste momento crucial na vida das pessoas em todo o Mundo, o que tem de ser feito prioritariamente é o isolamento social.

Foto: Marciel alves/JTNewsJacinto Teles ladeado pelos presidentes da Associação e do Sindicato,Fabrício e Rosivan respectivamente
Da direita para a esquerda Rosivan Santos (presidente do SINPOLPEN), Jacinto Teles (diretor Jurídico da Associação dos Policiais Penais do Brasil) e Fabrício Martins presidente da Associação dos Policiais Penais do Pará

Como liberar, mesmo com certa restrição, a entrada no presídio de um membro da família ou amigo de um interno do Sistema Prisional, se não temos como detectar se essa visita, ou mesmo advogado, está ou não acometida do novo coronavírus? Se ainda não se tem acesso ao exame para saber? Somente em casos gravíssimos poderá ter acesso ao teste. Liberando a visita poderá ter uma epidemia dentro dos presídios, que, não tenha dúvida chegará fácil aos profissionais do Sistema e a qualquer membro da sociedade.

Então nesse momento deve continuar o isolamento por um período rozoável, a ser esclarecido pelas autoridades sanitárias de saúde o momento certo de suspender, disse Rosivan, presidente do SINPOLPEN-PA.

Colisão de Direitos Fundamentais: brevíssima análisse para o caso concreto, pelo especialista em Direito Constitucional, Jacinto Teles Coutinho

Com a máxima vênia, mas, este editor do JTNEWS e diretor Jurídico da AGEPPEN-BRASIL, entende que os membros do Ministério Público do Pará, não obstante terem a legitimidade que lhes é peculiar constitucionalmente, agiram equivocadamente neste momento ímpar por que passa a população mundial em razão do Novo Coronavírus, pois essa situação do COVID-19 não é uma questão somente do Brasil, tampouco do Estado do Pará. 

Ela realmente é universal, tanto que a Organização Mundial de Saúde (OMS) já a qualificou como uma Pandemia.

Evidentemente que os argumentos apresentados pelos eminentes procuradores da República no Pará, não são na essência inadmissíveis, são sim relevantes; porém, em situação de normalidade poder-se-ia alegar o 'direito' de visita ao preso como um direito fundamental, jamais absoluto. 

Ademais, pelas condições de saúde já amplamente analisadas pelas autoridades sanitárias local, nacional e mundial, e, sobretudo, pelas consequências catastróficas já confirmadas mundo a fora [basta observar a Itália, a Espanha, New York-USA, a China-iniciante, e já o avanço em nosso País] do famigerado Novo Coronavírusnão se pode tergiversar acerca dessa lamentável situação a que chegamos, tampouco nos equivocar nos encaminhamentos em busca de solução a este determinado conflito.

Foto: JTNEWSCentro de Recuperação Regional de Abaetetuba - onde presos podem ser visitados se a Recomendação do MPF for aceita
Centro de Recuperação Regional de Abaetetuba - onde presos podem ser visitados se a Recomendação do MPF for aceita

Todos somos responsáveis, não podemos, jamais cobrar essa responsabilidade apenas do presidente da República [quando descumpre normas das autoridades sanitárias], devemos todos nós nos considerar corresponsáveis diretos, e, também chamar o MPF do Pará à reflexão, a meu ver, salvo melhor juízo, somente as autoridades do Sistema Prisional, obviamente, ouvindo as autoridades sanitárias podem suspender ou restabelecer tais visitas aos detentos.

Não há como mensurar a qualidade de saúde de cada visitante a determinado detento apenas pelas aparências, pois o COVID-19 em percentual mesmo que muito pequeno pode manifestar-se sem ao menos se observar os sintomas mais comuns [tais como: tosse, febre, dor de cabeça e falta de ar], sem dizer, que, pode determinada visita ter estado com uma pessoa infectada há horas e ainda não ter manifestados os sintomas.

Então, a visita neste momento mesmo que, com as cautelas aparentemente satisfatórias podem se tornar um desastre, portanto é uma temeridade se essa Recomendação do respeitável Órgão do Ministério Público Federal no Pará for acatada pelo secretário de Administração daquele estado, Jarbas Vasconcelos.

Embora o MPF-PA considere o direito de visita como absoluto, estamos inevitavelmente diante de uma situação de colisao de direitos fundamentais, já que o direito à vida é outro direito fundamental, e como estamos numa situação de vulnerabilidade abosluta perante o advento inesperado do Novo Coronavírus não resta dúvida que deve haver uma ponderação para a solução do conflito e isso deve ocorrer, posto que, todas as circunstancias envolvendo colisão de direitos fundamentais são de complexa solução, dependendo para se determinar o rumo a ser seguido das informações do caso concreto e dos argumentos fornecidos pelas partes envolvidas, e nesse particular do COVID-19 os argumentos das autoridades de saúde, não resta dúvida, são os que devem prevalecer.

Como ficou demonstrado, os direitos fundamentais não possuem natureza absoluta, portanto, em caso de conflito, não existe prevalência inata de um sobre o outro; mais uma razão para se realizar a ponderação, que inevitavelmente deve ser levado em consideração o Princípio Constitucional da Razoabilidade. Essa tem sido a linha de defesa de diversos estudiosos acerca do tema [colisão de direitos fundamentais].

Foto: Sérgio Lima/Poder360Ministro Luís Roberto Barroso é relator de processo sobre ICMS
Ministro Luís Roberto Barroso - constitucionalista

Nesse mesmo sentido, manifestando-se acerca desse tema da colisão de direitos fundamentais, o constitucionalista e atualmente ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luis Roberto Barroso, afirma que “não existe hierarquia em abstrato entre princípios, devendo a precedência relativa de um sobre o outro ser determinada à luz do caso concreto”, e, por nossa conta reiteramos: dentro da mais ponderada situação de Razoabilidade.

Foto: Reprodução/MPFConsiderando a providência adotada pela cúpula do MPF em Brasília, os membros do MPF-PA estão blefando ou sendo incoerentes
Não seria incoerência do MPF-PA querer liberar visita ao Sistema Prisional, sendo que em sua repartição central em Brasília, a Procuradoria Geral da República (PGR-MPF) suspendeu qualquer contato presencial em razão do COVID-19? Nada de visita, nem mesmo de advogados, tampouco de familiares de presos. Fica a reflexão...

Dessa forma, é mais do que prudente que o MPF-PA deva agir com razoabilidade e proporcionalidade para ponderar na busca da tão necessária solução do conflito, qual seja, liberação ou não de visita a presos do Sistema Prisional do Pará, cuja liberação pode se entender como o direito fundamental de que o enclausurado tenha de receber visita, ou o de não receber por garantia de vida pra si, para o visitante, que, no momento se um estiver infectado pode garanir uma morte mútua, isto é, ambos podem virem a ser condenados à morte pelo Novo Coronavírus.  

Assim, entende-se que os direitos fundamentais não são absolutos, e a efetivação destes, esá submetida a limites, que sempre devem ser aplicados mediante ponderação, cuja prática não mata a ninguém.

Essa é a minha opinião, salvo melhor juízo.

CONFIRA A ÍNTEGRA DA RECOMENDAÇÃO DO MPF-PA

Fonte: JTNEWS

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