Deputados gastaram R$ 37,7 milhões em divulgação de mandato em 2019

"Eram de cerca de R$ 21 milhões em 2010, cresceram sistematicamente ao longo dos exercícios, atingiram mais de R$ 50 milhões em 2016. Em 2017, abarcaram R$ 55 milhões das cotas", diz o TCU

Mesmo tendo à disposição uma das maiores redações de Brasília, com centenas de jornalistas espalhados pelo site, pela TV, pela rádio e pelo jornal da Câmara, deputados gastaram mais de R$ 37,7 milhões para divulgar suas ações em 2019. Todo o dinheiro foi ressarcido pela Casa.

O uso do recurso, previsto na cota para o exercício da atividade parlamentar (Ceap), também conhecida como cotão, é autorizado pelo Congresso. Mas virou alvo de recente contestação do Tribunal de Contas da União (TCU).

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Câmara dos Deputados

Em acórdão publicado no final de dezembro, o TCU questiona a necessidade de se usar dinheiro público para esse tipo de divulgação. Para os ministros, é quase impossível distinguir o parlamentar que se vale do benefício para prestar contas à sociedade daquele que o utiliza para se promover pessoal ou eleitoralmente.

O uso da verba pública para a divulgação do mandato é, na avaliação do tribunal, o gasto mais discutível em relação à cota parlamentar. No ano passado a Câmara e o Senado desembolsaram quase R$ 200 milhões para cobrir despesas atribuídas pelos congressistas ao exercício do mandato.

Gastos, por exemplo, com hotel, passagens aéreas, alimentação, aluguel de escritório político e veículos, telefone e combustível. O tribunal relembra que a Câmara oferece serviços de divulgação da atividade gratuitamente aos parlamentares.

Para o TCU, canais oficiais da Casa dão aos deputados a oportunidade de mostrar aos seus eleitores o que estão fazendo em Brasília, assim como suas próprias redes sociais na internet.

"Os gastos com 'divulgação da atividade parlamentar' movem-se na contramão da oferta deste serviço pela própria casa legislativa e dos modernos meios gratuitos de comunicação institucional, profissional ou pessoal", adverte o TCU no documento em que aponta excessos no uso da cota e recomenda redução e revisão do benefício.

Os gastos dos parlamentares seguem subindo e mais que dobrou nos últimos dez anos. "Eram de cerca de R$ 21.055 milhões em 2010 (13,64% da Ceap naquele ano), cresceram sistematicamente ao longo dos exercícios, atingiram mais de R$ 50 milhões em 2016 (22,83% da Ceap), e em 2017, abarcaram R$ 55 milhões das cotas", diz o TCU.

Apesar de ter totalizado R$ 37,7 milhões neste ano, o valor pode e deve aumentar, pois os parlamentares têm até três meses após o uso da verba para apresentar a nota fiscal e pedir o ressarcimento. Dezembro costuma ser o mês de maiores gastos com este fim.

No ano passado, 492 deputados usaram o dinheiro público para divulgar seus mandatos. O deputado Wellington Roberto (PL-PB) foi quem mais teve despesas de divulgação pagas pela verba indenizatória, totalizando R$ 318,9 mil.

Na segunda colocação vem deputado Nivaldo Albuquerque (PTB-AL), com gastos de quase R$ 299 mil, seguido por Paulo Teixeira (PT-SP), com R$ 277 mil.

O petista respondeu a reportagem por meio de sua assessoria de imprensa e afirmou que seu mandato "tem múltiplas atividades e atuação que devem ser divulgadas como prestação de conta aos que o elegeram. As contas estão dentro do orçamento disponibilizado pela câmara para a área e podem ser conferidas no portal da transparência".

O deputado Nivaldo está em viagem, por isso sua assessoria não conseguiu falar com ele para encaminhar uma resposta ao site. A equipe do Wellington ficou de encaminhar uma nota, o que não aconteceu até o fechamento desta reportagem.

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Tribunal de Contas da União

O TCU ressalta que a Câmara, assim como o Senado, possui gráficas que prestam serviços de editoração, impressão e publicação de não só de materiais de expediente personalizado, mas também relativos à atuação e desempenho parlamentar, produzindo informativos, publicações, documentos, folders e demais materiais para compor sua divulgação oficial.

"Várias notas fiscais para ressarcimento de 'divulgação da atividade parlamentar' referem-se igualmente à produção, editoração e/ou impressão de produtos, folders, livretos, material divulgativo, etc., de modo que a manutenção ampla e sem restrições dessa rubrica fornece duplo serviço aos legisladores", aponta o tribunal.

Outro ponto levantado pelo TCU diz respeito à contratação de empresas de publicidade que não têm sequer sites. "Os dados abertos das cotas também evidenciam pagamentos expressivos a gráficas, editoras, empresas de publicidade sem site, sem divulgação, aparentemente desconhecidas no próprio ramo de atividade", diz o acórdão.

Na avaliação do tribunal, o uso da verba de divulgação parlamentar acaba por servir para autopropaganda do político. "Embora sob a justificativa de propagar sua atuação para a população que representa, o uso mais perceptível da referida verba é a autopropaganda ou enaltecimento pessoal do deputado, mediante a compra do espaço na mídia às expensas do contribuinte para projetar sua imagem política", diz.

Por esses motivos, o TCU recomendou à Câmara que regulamente de maneira detalhada os gastos passíveis de ressarcimento nessa categoria, a fim de deixar claro exemplos de dispêndios que poderiam ser ressarcidos, a partir da experiência acumulada pela Casa, de modo que não se permita a utilização de recursos públicos na promoção pessoal do deputado. Recomenda ainda que os pedidos de ressarcimento sejam acompanhados da apresentação da publicidade ou divulgação realizada.

Fonte: Congresso em Foco e Instituto OPS

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