Com saída de Bolsonaro, PSL acelera ofensiva contra aliados do presidente

Presidente espera atrair 30 deputados para Aliança, e grupo de Bivar prepara retaliação

No mesmo dia em que o presidente Jair Bolsonaro confirmou sua saída do PSL para criar o partido Aliança pelo Brasil, o presidente da sigla, deputado Luciano Bivar (PE), deu início a uma ofensiva contra o movimento do antigo aliado. Em reuniões nos últimos dias, a cúpula do PSL decidiu acelerar os processos de suspensão de 19 deputados, entre os quais o atual líder na Câmara, Eduardo Bolsonaro (SP).

Foto: Marcelo Camargo/Agência BrasilBolsonaro e Guedes apresentarão três propostas de emenda à Constituição
Bolsonaro e Guedes apresentarão três propostas de emenda à Constituição

Bolsonaro tornou pública sua decisão de deixar o partido pelo qual se elegeu nessa terça-feira (12) em redes sociais, após reunião com deputados aliados. A agremiação a ser fundada será a nona de sua carreira política. 

Foto: Reprodução/TwitterJair Bolsonaro se pronunciou via Twitter
Jair Bolsonaro se pronunciou via Twitter

A saída do presidente do PSL acontece na esteira de denúncias sobre o esquema de candidaturas de laranjas nas eleições de 2018, revelado pela Folha em fevereiro. O racha no partido ficou evidente em outubro, quando Bolsonaro disse que Bivar está "queimado pra caramba". A legenda tem a segunda maior bancada da Câmara, com 53 deputados.

Numa tentativa de demonstrar que, mesmo diante de uma briga com o chefe do Executivo, o PSL mantém força política, a ideia do grupo Bivar é a de suspender o filho do presidente das atividades partidárias na próxima semana. Em seguida, essa ala pretende apresentar uma nova lista à Mesa Diretora da Câmara para reassumir o comando do partido na Casa. 

Foto: Marcelo Camargo/Agência BrasilLuciano Bivar presidente do PSL, foco da PF em ação de busca e apreensão em seu domicílio
A ideia do grupo de Luciano Bivar é a de suspender o filho do presidente das atividades partidárias na próxima semana

A avaliação de Bivar e seus aliados é a de que, como o novo partido de Bolsonaro ainda não existe e levará um tempo para sair do papel, os deputados serão obrigados a se agarrar ao PSL. Eles lembram que os congressistas precisam de respaldo e de uma estrutura partidária para que seus mandatos tenham representatividade na Câmara. 

Nesse cenário, os chamados bivaristas apostam que é possível formar uma nova maioria para retomar a liderança do PSL. Segundo congressistas que participaram do encontro com Bolsonaro nesta terça, no Palácio do Planalto, o presidente ficará sem partido até que a Aliança Pelo Brasil seja aprovada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). 

A expectativa do grupo de Bolsonaro é viabilizar o partido até março de 2020, a tempo de lançar candidatos às eleições municipais. São necessárias 500 mil assinaturas, em pelo menos nove estados, para que a criação de uma agremiação comece a ser analisada pelo TSE. A lista deve ser apresentada no momento em que é protocolado o pedido de registro na corte.

A equipe jurídica que auxilia o clã Bolsonaro pretende lançar um aplicativo e investir nas redes sociais para acelerar a coleta de assinaturas. O ex-ministro do TSE Admar Gonzaga e a advogada Karina Kufa estão à frente da empreitada. De acordo com a deputada Carla Zambelli, a plataforma eletrônica servirá como uma espécie de filtro inicial para a validação das assinaturas. 

"Não necessariamente a assinatura será eletrônica, mas você pode ter uma base eletrônica para ter certeza de que aquela assinatura, o nome, o número do título, o nome dos pais estejam corretos já", afirmou. 

"É a forma mais fácil para não correr o risco de alguém assinar de forma errada. É possível usar o apoio dessa plataforma, mas as assinaturas provavelmente têm de ser físicas", disse.

Filho mais velho do presidente e alvo de investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro, o senador Flávio Bolsonaro (RJ) será uma das principais vozes de uma campanha pela criação da Aliança. Para assumir a dianteira da articulação, ele se desfiliou do PSL na tarde desta terça. 

Por ter concorrido em uma eleição majoritária, Flávio não está sujeito à regra de perda do mandato, diferentemente de deputados que decidam deixar o PSL. O entendimento foi definido pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2015. 

Foto: Edilson Rodrigues/Agência SenadoSenador Flavio Bolsonaro nega estar apadrinhando o subprocurador-geral Antônio Carlos Simões Martins Soares para o comando da Procuradoria-Geral da República
Senador Flavio Bolsonaro, filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro 

Também presente, Bia Kicis (PSL-DF) disse que no próximo dia 21 o grupo que acompanhará Bolsonaro vai realizar uma convenção do novo partido. Ela espera que o próprio presidente comande o Diretório Nacional da legenda. Esses congressistas, no entanto, têm sido orientados a agir com cautela até que a Aliança seja oficializada. 

Segundo relatos, Bolsonaro também pediu que seus aliados não façam críticas ao PSL. "Ainda que a gente queira estar no novo partido [tem de] ter esse cuidado de não falar mal da casa que acolheu a gente", disse Carla Zambelli.

A legislação permite determinadas situações de justa causa para desfiliação partidária —em que o deputado ou vereador pode mudar de partido sem perder o mandato. Alguns exemplos: fusão ou incorporação do partido; mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; grave discriminação política pessoal; e, no último ano de mandato, sair para disputar eleição.

O pano de fundo da disputa no PSL é o fundo partidário, que até o fim de 2019 pode chegar a R$ 110 milhões. No próximo ano, somando os fundos partidário e eleitoral, o PSL pode ter em caixa R$ 350 milhões — o valor leva em conta as estimativas de R$ 1 bilhão para o fundo partidário, e os R$ 2,5 bilhões propostos pelo governo para o fundo eleitoral.

Os advogados que auxiliam Bolsonaro dizem acreditar que, ao levar mais da metade da sigla para a nova legenda, conseguem aval da Justiça Eleitoral para ficar com parte dos recursos. 

Para o líder do PSL na Câmara, deputado Eduardo Bolsonaro (PSL), é uma questão de justiça os dissidentes da legenda de Luciano Bivarlevarem sua parte do fundo partidário para a Aliança pelo Brasil.

“Se trouxer o fundo é bom por uma questão de justiça, porque o injusto é você ter sido eleito, sair do partido e ficarem tão poucos deputados no PSL e eles terem esse fundo todo à disposição deles”, defendeu Eduardo.

Segundo ele, o lado positivo de sair sem os recursos é atrair “pessoas que são mais conectadas” com as ideias bolsonaristas.

“Você afasta um pouco aquele perfil de político, principalmente de candidato, que só vai para o partido que tem fundo eleitoral, que não é nosso objetivo. Nosso objetivo é ter um alinhamento com pessoas”, disse.

Em manifesto divulgado nesta terça, a Aliança pelo Brasil é lançada como “uma nova e verdadeira atitude de aliados [de Bolsonaro]” e como o sonho e a inspiração de pessoas leais ao presidente.

O partido se apresenta ainda como um instrumento para “livrar o país dos larápios, dos espertos, dos demagogos e dos traidores”. 

“Aliança é união e é força. E a Aliança pelo Brasil é o caminho que escolhemos e queremos para o futuro e para o resgate de um país massacrado pela corrupção e pela degradação moral contra as boas práticas e os bons costumes”, afirma o manifesto.

O que está em jogo

Apoio no Congresso: O PSL tem a 2ª maior bancada da Câmara. Em um partido menor, em tese, Bolsonaro teria mais dificuldade de angariar votos para aprovar projetos

Cargos e funções na Câmara e no Senado: A participação em comissões permanentes no Legislativo é definida de acordo com a proporção de parlamentares em cada partido. Pela lei, quem muda de legenda perde o cargo ou função exercida que tenha sido distribuído com base nessa regra

Fundo partidário: A distribuição do fundo partidário (que financia, com verbas públicas, o funcionamento das legendas) leva em conta os votos obtidos na última eleição para a Câmara. Mudanças nas bancadas ao longo da legislatura não são consideradas na hora da divisão

Fundo eleitoral: O fundo público para campanhas eleitorais leva em conta o resultado da eleição —parlamentares aliados de Bolsonaro que eventualmente decidirem deixar o PSL não levam consigo uma fatia do fundo eleitoral. O valor do fundo será definido na votação da Lei Orçamentária de 2020, no fim do ano

Fonte: Folha de S. Paulo

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