Silvio Barbosa

Professor concursado do Curso de Comunicação Social da UFPI, campus Teresina. Doutor em Comunicação e Mestre em Filosofia do Direito é advogado e jornalista, com 24 anos de experiência de mercado, tendo trabalhado em empresas como Rede CBS (Estados Unidos), Globo, Bandeirantes, Record e TV Cultura. Autor dos livros TV e Cidadania (2010) e Imprensa e Censura (no prelo) e dos documentários Vale do rio de lama - no rastro da destruição, e Sergio Vieira de Mello, um brasileiro em busca da paz no mundo.
Professor concursado do Curso de Comunicação Social da UFPI, campus Teresina. Doutor em Comunicação e Mestre em Filosofia do Direito é advogado e jornalista, com 24 anos de experiência de mercado, tendo trabalhado em empresas como Rede CBS (Estados Unidos), Globo, Bandeirantes, Record e TV Cultura. Autor dos livros TV e Cidadania (2010) e Imprensa e Censura (no prelo) e dos documentários Vale do rio de lama - no rastro da destruição, e Sergio Vieira de Mello, um brasileiro em busca da paz no mundo.

Cor da pele é, afinal, um agravante penal? Sim ou sempre?

Até quando o preconceito de uma sociedade vai definir o caráter das pessoas?

Prisão de inocente acontece todos os dias nesse país, onde quem rouba comida no mercado vai para a cadeia (“furto famélico” é excludente de criminalidade, segundo nosso Código Penal), enquanto o político corrupto aguarda o julgamento em liberdade ou cumpre pena em prisão domiciliar, num palácio construído com dinheiro roubado.

A prisão de inocentes tornou-se rotineira num país em que a polícia não tem tempo ou técnica para fazer investigação. Acabamos de ver o caso, no Rio de Janeiro, do jovem músico negro que foi preso, com seu violoncelo, acusado por um assalto que não cometeu. Luiz Carlos Justino, de 23 anos, foi solto porque ganhou os noticiários quando os colegas de orquestra tocaram juntos na porta do presídio.

Foto: Imagem da TV RecordMúsicos da Orquestra de Cordas se apresentam em frente ao Complexo de Benfica, no Rio
Músicos da Orquestra de Cordas se apresentam em frente ao Complexo de Benfica, no Rio

O caso repercutiu e fez a Justiça se mexer, do contrário, ficaria preso até o julgamento.  A Justiça aceitou que ele tem álibi; estava tocando música clássica no horário do crime. Para sorte dele, há muitas testemunhas que viram a apresentação pública. Mesmo assim, Luiz, negro da periferia do Rio, ainda vai responder processo, afinal, já foi indiciado mesmo!

A cor da pele é agravante no nosso Brasil mestiço e racista. Isso não está escrito no nosso Código Penal, mas vigora em toda a Terra Brasilis. Não importa que o jovem negro tenha nas mãos um violoncelo, porque a cor da pele, para nossa vergonha, é considerada referência de caráter.

Lá trás, na década de 1960, o reverendo batista norte-americano – e prêmio Nobel da Paz - Martin Luther King disse, em seu mais famoso sermão, que virou um discurso em praça pública, durante a simbólica Marcha sobre Washington: “Eu tenho um sonho, o sonho de que um dia nós seremos julgados não pela cor da nossa pele, mas pela força de nosso caráter”.

Lá como cá, o racismo está à flor da pele e reflete na ação cotidiana das pessoas e das polícias... O racismo se tornou estrutural, ou seja, se dilui, perpassa relações e se apresenta no dia-a-dia do brasileiro, às vezes camuflado, às vezes em explosões de prepotência, superioridade, de ignorância flagrantemente racista.

Está na fala das pessoas, no julgamento diário, no comentário sobre a aparência física, em que a noção - estereotipada positivamente - de SER branco europeu (claro, loiro, “traços finos”) é a única referência possível de se enxergar o belo, ou aquele a quem se deve dar valor. O jovem negro continua e continuará sendo considerado um risco para a sociedade, que não quer e que não tem vontade de enxergar o óbvio: cor de pele não define caráter...

Que o digam todos os ex-governadores do Rio, poderosos homens brancos, presos por corrupção. E o atual governador afastado, um ex-juiz de direito, branco, tirado do cargo por suspeita de ter recebido propina. O Secretário de Saúde de Wilson Witzel, também acusado, foi tão torpe que chegou a desviar verbas que deveriam ser usadas na compra de respiradores em plena pandemia do Covid-19. Desviar dinheiro de algo que será usado para salvar vidas, é assassinato!

O político corrupto, afinal, tem algum caráter por baixo de sua pele branca? Se não tem, por que será que parecemos só não ver caráter na pele negra?

Como reeducar nossa população a reconhecer que os criminosos mais perigosos, que mais danos fazem ao país, não estão nas periferias, mas nos palácios. E esses criminosos têm pele clara e estão associados diretamente às elites, que não são negras...

Eu tenho um sonho... que um dia o jovem violoncelista da Orquestra de Cordas da Grota possa ser julgado pelo caráter e não pela cor.

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