Salário mínimo terá quarto aumento real seguido, depois de superar fase 'menor abandonado'
Valor previsto de R$ 1.621 para 2026 é resultado de fórmula adotada em 2007 e que havia sido abandonada dez anos depois. entre 2017 e 2022.O salário mínimo no Brasil será de R$ 1.621 a partir de janeiro, segundo previsão anunciada pelo Ministério do Planejamento e Orçamento. Na comparação com o valor hoje vigente, um aumento real (acima da inflação acumulada em 2025) de aproximadamente 2,6%.
Será o quarto aumento real desde 2023, primeiro ano do governo Lula, chegando assim a 11,5% acima do índice inflacionário acumulado. Esse aumento, como os três anteriores, obedecem a regra estabelecida em 2007, no primeiro mandato de Lula, após negociação entre as centrais sindicais brasileiras, o Executivo e o Congresso Nacional.
A fórmula é: crescimento do PIB + inflação = aumento do salário mínimo.
O PIB que conta para essa operação é aquele registrado dois anos antes. Ou seja, em 2026, o crescimento do PIB a ser considerado é o obtido em 2024, que foi de 3,4%. Já a inflação a ser incluída na fórmula é a de 2025, que, até novembro, índice mais recente, é de 4,46% em 12 meses.
Pelo arcabouço fiscal, em vigor desde 2023, o repasse do crescimento do PIB é limitado a 2,5% - como acontece com parte dos investimentos do Governo, exceto aqueles que têm piso constitucional garantido, como Educação e Saúde, por exemplo.
Os aumentos anuais do salário mínimo, com o retorno da fórmula de valorização permanente a partir de 2023, interrompem um período em que o piso salarial em vigor no Brasil ficou estagnado. Essa fase "menor abandonado", agora superada, havia tido início em 2017.
Dos tempos do Getulio Vargas
O salário mínimo vai completar 90 anos em 14 de janeiro do ano que vem. A data marca a assinatura do decreto, por Getulio Vargas, que instituiu o piso nacional. O pagamento efetivo do salário mínimo só aconteceria quatro anos depois, em maio de 1940. Nesse intervalo, comissões compostas por representantes do Executivo, do empresariado e dos sindicatos de trabalhadores debateram o conceito de salário mínimo e os valores monetários. À época, passaram a vigorar valores diferentes para cada unidade federativa. A unificação só viria em 1984.
Diferentemente do que reza a lenda, o salário mínimo não foi uma concessão do então presidente. Vargas respondia a pressões internas e externas. Havia também uma intenção estratégica: ele sabia que o desenvolvimento industrial que seu governo pretendia estimular dependia de um mercado interno mais forte, e para isso era necessário fortalecer a capacidade de consumo via salários.
Porém, a proposta de salário mínimo já era uma ideia estabelecida internacionalmente e objeto de intensa disputa política.
Em 1928, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), criada nove anos antes – agregando empregadores, trabalhadores e governos – como parte dos esforços para reconstruir as relações internacionais, desfiguradas pela Primeira Guerra Mundial, aprovou a Convenção 26, recomendando a todos os então 45 países-membros a adoção do salário mínimo como norma legal em seus territórios.
Desde antes, os movimentos trabalhistas internacional e brasileiro já vinham realizando mobilizações e greves de forte impacto. Todas essas manifestações tinham o aumento dos salários como uma das reivindicações centrais. No Brasil, um dos principais exemplos foi a Greve Geral de 1917.
O mundo se erguia dos escombros da grande guerra, de um lado, e, de outro, observava a Revolução Russa instaurando uma nova ordem geopolítica global. Aquela conjuntura, recheada de revoltas operárias em diversos países, combatidas com repressão e sangue, mas incansáveis, recomendava atenção aos direitos sociais.
Nem por isso o salário mínimo foi aceito pacificamente por setores do empresariado brasileiro e por parte da imprensa nacional. Houve quem previsse o caos econômico e uma epidemia de falências.
Oito anos sem aumento, até uma greve
Em 1943, houve um segundo aumento do salário mínimo, em duas parcelas. Getúlio, que havia instituído o Estado Novo e governava sem Congresso, deixou o Palácio do Catete - então sede do Executivo - após intervenção militar, em 1945. Depois da deposição, um terceiro aumento do salário mínimo só seria decidido em 1951, no segundo mandato getulista, desta vez eleito pelas urnas.
Em 1953, um novo aumento. E não foi sem pressão popular. O movimento sindical, ainda sob regras restritivas - pena de prisão para quem paralisasse atividades ou fizesse propaganda considerada subversiva, para citar dois riscos - ousou realizar greves amplas naquele ano. Na capital paulista, o movimento ficaria conhecido como a Greve dos 300 Mil, envolvendo movimentos populares em defesa da moradia, saúde e transporte públicos e contra a carestia.
Os grandes protestos contra o alto custo de vida serviram de amálgama para que o salário mínimo fosse defendido de forma a cumprir sua função constitucional, ou seja, a de cobrir as necessidades básicas das pessoas. O próprio conceito do salário mínimo foi debatido: qual seria o valor necessário, e por que deveria considerar apenas a existência individual, e não a de uma família?
Outro ponto fundamental daquela greve foi a crítica aos índices que mediam o custo de vida, coletados por instituições submissas aos poderes municipais e estaduais, e que flagrantemente eram manipulados - para baixo, sempre. Daquela efervescência surgiu a proposta, apresentada em assembleia sindical por um metalúrgico chamado Paul Singer, de criação de um instituto independente, patrocinado pelo movimento sindical. O Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) seria criado dois anos depois.
Getúlio promulgou o novo salário mínimo em 1954. Era o dobro: de 1.200 cruzeiros para 2.400 cruzeiros. No entanto, sua entrada em vigor, prevista para maio, só aconteceu em julho. O atraso se deveu a pressões dos empresários - federações do setor entraram com recurso junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) e setores da imprensa se opuseram com virulência. Jornais chegaram a prever demissões em massa e "debacle" da economia nacional. A pressão contra Getúlio vinha de diversas frentes. O presidente cometeu suicídio em agosto.
Naquele mesmo 1954, outra greve geral, em 2 de setembro, pressionou empresários recalcitrantes a efetivamente pagarem o novo salário mínimo e os demais reajustes conquistados em campanhas salariais. Demissões e prisões entraram na conta.
Os períodos seguintes não foram mais fáceis. Na chamada era dourada de Juscelino Kubitschek, houve sólido reajuste do salário mínimo, em 1959. O aumento refletiu, em parte, a chamada Greve dos 400 mil, organizada no ano de 1957 em São Paulo, principal centro industrial. A greve se espraiou por outras praças. Porém, a tal era dourada apresentava ferrugens para os assalariados e trabalhadores em geral, expostas logo nos anos seguintes.
Arrocho e recuperação
No biênio 1960-61, houve outros dois reajustes do mínimo. Mas a inflação crescente vampirizava seu poder de compra. Esse período, que se estende até 1964, é classificado pelo Dieese como de "corrosão". O período seguinte, que vai de 1965 a 1975, é apontado como de "arrocho".
Embora a ditadura civil-militar instalada no Brasil se jactasse do chamado "milagre econômico", quando a média de crescimento do PIB atingiu 11% entre 1968 e 1973, o salário mínimo ficou enfraquecido. Houve reação entre 1976 e 1982, nova corrosão no período 1983-94 e, após o controle inflacionário conquistado com o Plano Real, iniciou-se um período de recuperação a partir de 1995.
Valorização permanente
Eleito em 2002, Luiz Inácio Lula da Silva chegou à Presidência da República carregando sobre si imensas expectativas. Uma delas advinha da promessa de campanha de dobrar o valor do salário mínimo e fortalecer o seu poder de compra durante o futuro mandato.
Em 2003, o mínimo teve reajuste de 20%, com o objetivo de resgatar perdas acumuladas. Em 2004, o aumento foi de 8,33%, superando a inflação. No final daquele ano de 2024, o movimento sindical decidiu desenhar uma nova estratégia. As centrais se uniram numa marcha nacional para pressionar por um novo aumento para 2005 e, mais do que isso, pela elaboração de uma política de valorização permanente do salário mínimo.
Novamente, no final de 2005 e de 2006, essas centrais levaram milhares de trabalhadoras e trabalhadores, a imensa maioria de ônibus que partiam de diferentes pontos do Brasil, para realizar uma caminhada dos arredores de Brasília até a Esplanada dos Ministérios, reivindicando aumento real e uma política permanente de valorização do piso salarial brasileiro. A mobilização ficou conhecida como Marcha Nacional do Salário Mínimo.
Com uma fórmula de aumento anual elaborada com a ajuda do Dieese, após diversas rodadas de negociação entre as centrais, e com o apoio do então ministro do Trabalho, o ex-presidente da CUT Luiz Marinho, e do próprio presidente Lula, surge a partir da 3ª Marcha, em 2007, a aplicação prática da fórmula PIB + inflação = novo salário mínimo, que se tornaria lei em 2011.
Os aumentos passaram a ser antecipados em um mês, na comparação com os anos anteriores, até que se tornaram fixos a partir de 1º de janeiro, garantindo quatro meses com mais recursos para os trabalhadores do que o calendário tradicionalmente seguido desde 1940.
"Menor abandonado" é adotado de novo
A presidenta Dilma Rousseff seguiu aplicando a fórmula no primeiro e segundo mandatos. Após o impeachment, classificado como golpe por setores democráticos, o sucessor de Dilma foi obrigado a aplicar a fórmula em 2017, pois o aumento já estava dado antes que ele se sentasse à cadeira presidencial. No entanto, o processo foi abandonado nos anos seguintes e a revisão da política de valorização do salário mínimo, legalmente prevista para 2019, esquecida.
Com o grupo instalado a partir de 2019 no Palácio do Planalto, o salário mínimo ficou estagnado. A volta de Lula à Presidência, em 2023, marcou a retomada da valorização do piso salarial nacional. Naquele primeiro ano do terceiro mandato, duas correções do valor, em janeiro e maio, garantiram aumento real. No ano seguinte, Lula retomou a fórmula adotada a partir de 2007.
Chega-se, assim, ao retorno do "menor abandonado". Se o processo de valorização for, de fato, permanente, com respeito à lei, e com a ajuda de crescimento econômico e controle inflacionário, o salário mínimo pode experimentar, no longo prazo, o pleno cumprimento de seu preceito constitucional, de prover as necessidades de uma família.
A combinação do salário mínimo com políticas sociais de redistribuição de renda - como a recém-aprovada isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês e diminuição das alíquotas até R$ 7.350 - pode, no longo prazo, consolidar a queda da pobreza e da extrema pobreza e, quiçá, ampliar seguidamente a renda média dos trabalhadores e trabalhadoras. O salário mínimo é uma referência para os reajustes salariais de todas as categorias profissionais e ainda determina a correção dos pisos previdenciários.
Há quem prefira apontar nessas combinações o "risco" de mais gasto público. Nenhum deles ganha salário mínimo.
Fonte: JTNEWS com informações da Agência Gov
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