Maria das Graças Targino

Doutora em Ciência da Informação, Universidade de Brasília, e jornalista, finalizou seu pós-doutorado junto ao Instituto Interuniversitario de Iberoamérica da Universidad de Salamanca, Espanha. Sua experiência acadêmica inclui, ainda, cursos em países, como Inglaterra, Cuba, México, França e Estados Unidos. Tem produzido artigos, capítulos e livros em ciência da informação e comunicação, enveredando pela literatura como cronista. Depois de vinculação com a Universidade Federal do Piauí por 25 anos e com a Universidade Federal da Paraíba por 14 anos, hoje, dedica-se à literatura, especificamente, ao jornalismo literário e a crônicas.
Doutora em Ciência da Informação, Universidade de Brasília, e jornalista, finalizou seu pós-doutorado junto ao Instituto Interuniversitario de Iberoamérica da Universidad de Salamanca, Espanha. Sua experiência acadêmica inclui, ainda, cursos em países, como Inglaterra, Cuba, México, França e Estados Unidos. Tem produzido artigos, capítulos e livros em ciência da informação e comunicação, enveredando pela literatura como cronista. Depois de vinculação com a Universidade Federal do Piauí por 25 anos e com a Universidade Federal da Paraíba por 14 anos, hoje, dedica-se à literatura, especificamente, ao jornalismo literário e a crônicas.

Pandemia, educação e desenvolvimento das habilidades das crianças

"Apesar das terminologias distintas vigentes nas diferentes nações, os impactos da pandemia na educação foram incalculáveis por toda parte"

Ainda que surjam controvérsias, acredita-se que a pandemia da Covid-19 foi detectada no dia 1 de dezembro de 2019, em Wuhan, sétima cidade da China localizada no centro do país, dentre um grupo de indivíduos com pneumonia de causa desconhecida, a maioria deles, vendedores ambulantes do Mercado de Frutos do Mar.

Foto: PinterestPandemia, educação e desenvolvimento das habilidades das crianças
Pandemia, educação e desenvolvimento das habilidades das crianças

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a Covid-19 como emergência de saúde pública de interesse internacional, uma vez que afetou todos os continentes, com incidência mínima tão somente na Antártida, continente onde habitam poucos seres humanos.

No auge de tantas mortes e de tanta gente infectada, os números não chegaram a expressar com fidedignidade as verdadeiras dimensões da catástrofe que surpreendeu a todos. Afinal, nenhum organismo mundial, incluindo a OMS, nenhuma nação, nenhum sistema de saúde, nenhum médico, nenhum economista, nenhuma equipe de medicina legal, nenhum agente funerário, nenhum empresário, nenhum cidadão, enfim, ninguém estava preparado para o rastro de horror causado pela Covid-19.

No Brasil, o caos agravou-se face à conduta desencontrada entre presidente, governadores, prefeitos e políticos em geral e o vácuo que caracterizou a atuação do Ministério da Saúde. Como a incerteza pairou em todos os cenários e segmentos, em meio à guerra ruidosa entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, não restam dúvidas de que um dos pontos imediatos de estrangulamento refere-se à educação em sua concepção ampla, alcançando todos os níveis, incluindo a educação básica e a educação superior, em termos de graduação e pós-graduação.

Na educação básica, estão a educação infantil, o ensino fundamental e o médio. Apesar das terminologias distintas vigentes nas diferentes nações, o fato é que os impactos da pandemia na educação foram incalculáveis por toda parte. No caso nacional, a Covid-19 trouxe efeitos extremamente negativos no processo de alfabetização, em especial, na esfera das famílias de baixa renda, cujas crianças vinculadas a escolas públicas, cujos calendários escolares obedeceram a critérios distintos, perderam a oportunidade, durante tempo relativamente muito longo inestimável, de socialização com demais companheiros de sua faixa etária, o que causa prejuízos emocionais e atraso no desenvolvimento de suas habilidades, sem contar as questões nutricionais, haja vista que muitos têm no lanche escolar sua única refeição mais bem elaborada

Em se tratando, especificamente da educação  pública  municipal  da capital Teresina – Piauí, além do fato de as escolas terem sido o primeiro segmento a suspender suas atividades, e, ironicamente, as últimas a regressarem ainda em meio ao caos de datas imprecisas e da justa reivindicação de salários dignos por parte dos docentes, as famílias não contaram com meios previamente planejados pela Secretaria Municipal de Educação.

Em que pesem os discursos eloquentes e enganosos dos que estão à frente da SEMEC, o acesso à internet persistiu com funcionamento para lá de ineficiente, sem a disponibilização de chips, celulares e/ou tablets, mantidos pela Secretaria desde a gestão anterior. Iniciativas mínimas e de baixo custo, como adaptação dos tablets e repasse de chip com acesso à Grande Rede para que o alunado utilizasse em família de modo a garantir a elaboração das atividades escolares, nada foi feito. E mais grave, os docentes também não contaram com o apoio irrestrito para utilizar recursos e, em especial, obter cursos de capacitação para se adaptarem à modalidade on-line imposta sem treinamento e diagnóstico do nível de familiaridade dos professores com os aparatos tecnológico.

Sem suporte do órgão competente, alguns poucos professores lançaram mão de seus celulares, notebooks e internet para dar continuidade às aulas no período crítico da pandemia, com ênfase para as crianças em nível de alfabetização. Literalmente, o corpo docente com seus parcos recursos “se virou nos 30”, buscando formas de se reinventar para não deixar as crianças à total deriva, tentando humanizar o processo de ensino-aprendizagem e não interromper o desenvolvimento das habilidades das crianças, reduzindo a evasão, que, em termos estatísticos, tem sido (continua sendo) elevada, pela falta de motivação diante do descaso dos governantes que reconhecem a educação como prioridade número um na Constituição de 1988.  

Decerto, as consequências negativas ao ato de aprender durarão anos até serem minimizadas e/ou vencidas. Como antevisto, o ano de 2022, ao tempo em que retornou, teoricamente, a sala de aula, trouxe séria greve da educação pública municipal. Trata-se de reivindicação por parte dos profissionais da educação do rateio do FUNDEB e o reajuste de 33,23% no piso salarial. Por falta de negociação viável por parte da Prefeitura Municipal, a paralisação perdurou até setembro de 2022, com risco, ainda, de ser ela retomada por descumprimento da Lei pelos gestores.

E o que restou de todos esses percalços é o retorno às aulas presenciais das crianças com nítida defasagem do processo de ensino. Por exemplo, vêm sendo identificadas crianças de oito anos sem identificar as letras do alfabeto; não rascunhar o próprio nome, e, por conseguinte, sem saber ler.  É doloroso enfrentar a realidade de crianças com oito anos sem a posse de habilidades básicas comuns a crianças de quatro anos do primeiro período. Quem ousa negar que tal defasagem na ausência de habilidades imprescindíveis traz prejuízos enormes para a educação de alunos e alunas mais adiante?

E mais, após o período crítico da pandemia, ainda há turmas sem professores para as aulas presenciais, com a ressalva de que, mesmo todos os professores tendo retornado ao dia a dia da escola no início  do mês  de setembro, a defasagem no quadro docente prossegue de forma significativa, uma vez que seu total é insuficiente para cobrir todas as turmas. E é o professor o carro-chefe de toda a escola no avanço das habilidades do alunado, incluindo a capacidade de conviver e respeitar os demais, em que pesem as diversidades inerentes a qualquer grupo!

Por fim, quanto à formação plena do indivíduo e aos novos letramentos em tempos de Covid-19, não há dúvidas de que o ano de 2020, século XXI, passará para a história como um marco, com ênfase para as questões educacionais. Como decorrência, virão consequências indeléveis no processo formativo integral do ser humano, em nível de alfabetização, letramento, multiletramentos, ensino híbrido e, sobretudo, perspectiva frente à vida pós-pandemia.

A este respeito, o Papa Francisco lançou, maio de 2020, um livro editado pela Libreria Editrice Vaticana, 68 páginas, intitulado “Vida após a pandemia”, disponibilizado no espaço virtual em diferentes línguas. Num dos trechos, lembra o quanto a perda do contato humano durante a pandemia nos empobreceu. Fomos separados dos amigos, em especial, da família, “incluindo a crueldade total de não podermos acompanhar os moribundos em seus últimos momentos de vida e depois chorá-los [...] Não consideremos óbvio o fato de podermos retomar a convivência no futuro, mas redescubramo-la e encontremos formas de fortalecer [...] esta possibilidade”, diz Ele (p. 14).

Esta parte final da transcrição do Papa Francisco, quando diz ser preciso redescobrir as formas de convivência com o outro, é fundamental. Isto porque, a quarentena (restrição para quem pode ter sido exposto ao vírus, mesmo sem sintomas); o isolamento social (separação de quem está doente dos demais); o distanciamento social (medidas para reduzir a interação entre as pessoas); e o lockdown (bloqueio total das coletividades, com permissão única para sair para atividades essenciais) deixaram expostas nossas vísceras: debilidades e dificuldades no convívio familiar, na convivência social e, em especial, na vida escolar desde a alfabetização.

Fontes:

PAPA FRANCISCO. Vida após a pandemia. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2020.

TARGINO, M. das G. Processos formativos e novos letramentos em tempos da Covid-19. In: HARDAGH, C. C.; FOFONCA, E.; CAMAS, N. P. V. Processos formativos, tecnologias imersivas e novos letramentos: convergências e desdobramentos. Curitiba: Ed. Collaborativa, 2020. 250 p. p. 80-95.  

Daliany de Sousa Santos é professora e pós-graduada em docência do ensino superior, é assistente social formada pela Universidade Federal do Piauí e Bacharel em Direito, pela Estácio de Sá, Teresina – PI.

Texto escrito por Daliany de Sousa Santos e Maria das Graças Targino, jornalista e pós-doutora em jornalismo pela Universidad de Salamanca / Instituto Interuniversitario de Iberoamérica. 

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